Sinto-me uma natureza morta, um corpo ex machina. Sinto a alma quase sucata. Sinto-me sem força. Mas, a cortar o firmamento, as minhas asas já foram mais vigorosas do que todas as asas de todos os arcanjos. Agora, condenado pelo prazo, quieto, sou um mero espectador do céu. Vejo-o de baixo. É uma vista triste, que apenas me permite a fome e faz em mim, caída, a sensação da morte lenta. A erosão da minha carne pelo tempo impede-me o resgate para agora. Pousado não tenho regresso. Sei até que Ícaro deixou de ter inveja de mim e que, como um abutre, já começou a cantar I can fly, but I want his wings. Mas, mesmo no chão, não me rendo. Não sou um sonho, sou uma máquina voadora. Voo África.
fotografia © José Silva Pinto
legenda © Sérgio Faria
legenda © Sérgio Faria
6 comentários:
esta legenda é porque esta fotografia, que me foi oferecida ontem pelo José, calhou a uma das paredes que agora olho e me parece céu.
Ainda bem!
Ou, como dizem outros: aleluia!
Não tenho asas mas voo,
com pés raízes na terra, atiro os olhos para os longes e vejo céu,
sei que há caminho, por isso a ele me faço, vou!
Porra, disparem que disparam bem!
E não só como um outro Sérgio...
Ao observar este blog encontrei-me a pensar:
como é possível que em terra de Sérgios destes (e Nunos e Pedros), aquele David seja "rei"?
É preciso que os oureenses estejam mesmo céguinhos para terem como presidente da Câmara um zarolho daqueles!
Observador cá da terra
O texto é lindíssimo!
A fotografia, nostálgica!
É quase uma alegoria a todos nós.
Também um dia chegará a hora de parar!
Custa, dói, mas faremos com toda a dignidade!
Parabéns aos "dois"
GR
"Que é voar?
É só subir no ar,
levantar da terra o corpo, os pés?
Isso é que é voar?
Não.
Voar é libertar-me,
é parar no espaço inconsistente
é ser livre, leve, independente
é ter a alma separada de toda a existência
é não viver senão em não-vivência
E isso é voar?
Não.
Voar é humano
é transitório, momentâneo...
Aquele que voa tem de poisar em algum lugar:
isso é partir
e não voltar."
Ana Hatherly
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