“La vie est de brûler des questions.”*
Houve um tempo em que éramos outros, conseguíamos ser, fazíamos, passávamos. Agora é tanto o que nos afecta, a separação de corpo dia após dia, o trânsito quieto, o dos fluxos pendulares e o das distâncias, um exílio estranho, doméstico. Quase já não há fora ou mais. Quase já não há tempo. O que acontece parou-nos. Somos a tragédia, o fim dela, o fim mesmo repetido, repetido, repetido, repetido. Somos o bicho que pergunta, porém porquê?, para quê?, para onde? deixaram de ser perguntas sobre o destino. A emergência transformou-as em índices antigos, ícones do que fomos. Se se continua a fazer, se se continua a passar, é porque ainda é possível, algo deixa, continuar a fazer-se e a passar-se pelos resíduos daquelas interrogações que já não são. Diante de nós está o passado por fazer e por passar. É de lá, de quando juntos, que esta carruagem nos trouxe. Vieram holandeses também. (Esta frase, final, é suprimível, por, no futuro, para a memória que houver, não ser necessária.)
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* in Antonin Artaud, L’Ombilic des Limbes suivi de Le Pèse-Nerfs et Autres Textes, Paris, Éditions Gallimard, 1968.