2006-04-13

fotografia © William Henry Fox Talbot, The Open Door, 1844


Manifesto a quem não digo

É importante não iludir a improbabilidade do que acontece como sociedade, entre duas ou mais pessoas. Porque a vida cicatriza-se numa certa ordem que não há. Mesmo quando o (a)caso da vida é o amor.
Para sempre? Pouco é o que é, se for, para sempre. E o amor não é desse pouco. Poderá haver amor que seja para sempre. Mas, mesmo esse, é um amor, amor até que. Claro que há amor para sempre. Em determinados momentos suspende-se um fulgor, um incêndio e, nesse mesmo instante, eterniza-se a sua labareda. Porém, cedo ou tarde, como acontece com os iogurtes, embate num limite, esmorece, cessa. Em última instância como consequência da morte. Mas muitas vezes antes dessa consequência. Sabe-se isso, sabe-se lá porquê.
Ao mesmo tempo que uns entoam o refrão everlasting love, outros repetem love will tear us apart. Às vezes uns são os outros e vice-versa, os mesmos, em tempos diferentes. Na prática, em cada um de nós tende a conjugar-se o título de um filme, Dr. Strangelove or: how I learned to stop worrying and love the bomb, e a letra de uma canção, Because if it’s not love
then it’s the bomb, the bomb, the bomb,
the bomb, the bomb, the bomb, the bomb
that will bring us together. Não há qualquer certeza nisto. Tragédia também não. É mera conjectura.

O que se sabe é que por cada fim há uma continuação. Por cada princípio há um regresso. Assim justa a vida, passos e não caminho. Porque a vida é como uma porta, abre e fecha, une e separa, integra e distingue, relaciona e afasta. Daí que, em caso de dúvida, tão justo quão doloroso, seja de admitir a porta aberta, hipótese do que entra e do que sai. É que, no trânsito vital, há desencontro, encontro, recontro e reencontro, andanças a acontecer contra e sobre a vi(d)a única. Ou seja, a porta, fronteira, aberta é um modo de alguém crescer e doer consigo. E com os outros.