2006-03-31

FOTOLEGENDA - 14

Na doca do Jardim do Tabaco.
Talvez, ironicamente, o último reduto para quem vai deixando de ter onde fumar um cigarro.

E pensar. Pensar na vida. Ou não pensar. Não pensar na vida.
Apenas olhar! Para lado nenhum. Deixar-se ficar. Assim.
Até que o morrão do cigarro queime os dedos. Ou nem sentir o calor – ou o frio.
Até tudo ser só cinza, pó. Nada.
(foto de Pedro Gonçalves)
(legenda de Sérgio Ribeiro)

foto&legenda # 21


Vem do acto da chuva, acto superior ao batismo, uma sensação de redenção. De redenção porque pela experiência das suas bagas faz-se presente que vivemos noutra bolsa, numa gestação diferente da gestação provisória, vivida no seio materno. Agora, soltos, somos entregues ao céu aberto, às contas de cristal macio que, splash!, nos atingem e lavam. Agora, de tudo nos lavamos, excepto da culpa e da cumplicidade das mãos que fazem o pão e a vindima.
fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Faria

2006-03-30

foto&legenda # 20


O lavor tinha como motivo outras presas. Mas a água apanhada e desfiada nos filamentos daquele fiado, disfarçada sob a forma de pérolas, transformou o que era uma rede destinada à captura de corpos num enredo de colares, num tecido de rosários. Da matéria que fazia o cárcere, a natureza fez um adorno, fez um conduto de orações.
fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Faria

FOTOLEGENDA - 13


Diz quem julga saber que uma aranha faz uma teia por dia.
Em cada dia, a aranha saliva e tece e insiste e persiste.
Urde. Porque, em cada dia, a aranha põe no seu tear os fios da teia.
Se hoje escapou, ela, à forte chuvada que lhe destruiu o que hoje tinha urdido, amanhã pôr-se-á, de novo, a tear os fios da sua teia.

A teia, isto é, luta quotidiana, também a trama, também a entrega, também a intriga.


(foto de Pedro Gonçalves)
(legenda de Sérgio Ribeiro)

2006-03-29

foto&legenda # 18

Não sei quantas, em número certo, mas foram muitas as vezes que enfrentei este meu vizinho, quase sempre com os seus braços jogados para trás, abertos. A última vez que lhe encontraram as mãos, como se fosse um cadáver, não foi apenas para conter a noite. Aconteceu-lhe isso, como pena longa, no mesmo dia em que abandonaram a casa que ele ainda guarda, junto com os degraus falseados pela erosão, armados em meio círculo, escondidos e esquecidos atrás das suas duas abas. Como outrora testemunhou dores e vigiou urgências passadas através de si, agora segura jogos e corpos de infância. Porque é de ferro, o corpo do meu vizinho resiste, soberano, preservando as suas solenidade e elegância graves. E, tão velho quão imponente, já memória e ainda presença, subsiste a bandeira da minha rua. Não porque, aqui, seja a maior portada sob o nome de Teófilo Braga, mas porque é o limiar que, franqueado, mais tempo cumpriu e defendeu qualquer dos frontispícios desta artéria.
fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Faria

2006-03-28

foto&legenda # hors-série

pomme fiction. provavelmente, quem sabe?, o corpo é apenas coreografia. iniludível, porém, é o declive do peito precipitado sobre a mais exacta das formas, a maçã, o fruto que tira o mistério da fome do mundo.
fotografia © Lilya Corneli
legenda © 3ás

2006-03-25

Aviso à (eventual) navegação

Foto&Legenda completou um mês de publicação.
Já aqui estão 32 "posts" que tiveram 1523 "visitantes" que deixaram 86 comentários (alguns "da casa", evidentemente).
A quem possa estar a apanhar este blog em andamento, recomenda-se a leitura dos editais, ou seja, do primeiro "post", de 24 de Fevereiro. Embora breve possa ter de vir a ser publicado um novo edital...
Cordiais saudações,
(parte de) a "gerência"

2006-03-24

LEGENDAFOTO - 7


Quando mergulhou o pé calejado na água fria do Agroal sentiu um arrepio pela espinha acima.
As unhas tortas e há muito por cortar pareceram-lhe agora exageradamente grandes e feias. Na verdade, mais se diriam uns gadanhos sujos que unhas de mulher…
Mergulhou o outro pé.
Arrepiou-se outra vez.
"Chiça, que está fria!”
Viu a água acariciar-lhe a pele da perna gorda e sentiu-se tentada a mergulhar a mão, o braço, o corpo todo e, de olhos fechados, deixar-se levar pela corrente.
Sentiu que para o rio não havia horas marcadas nem dias da semana.
A pressa era sempre a mesma e as margens eram sempre duas.
Tudo simples.
E belo.


(texto e foto de Pedro Gonçalves,
com a "colaboração" de Sérgio Ribeiro)

FOTOLEGENDA - 12

(foto de Pedro Gonçalves)

Molha-pés no Agroal
(…)
“Ai o bem que isto me faz às varizes…”
“A mim é ao inquezema.”
“Já cá venho inda era miúda…”
“Pois eu é a primeira vez, vejam lá… se soubesse que era assim tinha trazido um crochezinho.”
“Olhe só para aquilo ali do outro lado… já não há vergonha… havia de ser uma filha minha…”
“E os nossos homes já teriam acabado o piquenique?”
“Ai, já, comadre, mas só nas nas comidas porque nas bubidas nunca param, já devem estar entretidos, uns na sueca, outros na soneca…”
“Estou que nem posso c’as minhas cruzes.”
(…)


(conversa imaginada por Sérgio Ribeiro)

2006-03-22

foto&legenda # 16

Aqui, postos sob o silêncio, sentem-se dois murmúrios. Um, por que me queres?, ó memória, jogado pelo tiquetaque cardíaco deste lugar. O outro, quero-te para meu corpo, ó cidade, segredado pelas elipses contínuas do tempo. É este diálogo de vozes quase caladas que se repete e cruza com outro sussurro, a erosão lenta do fio tecido por Ariadne. O lugar vai afrouxando em mistério, vai sendo vencida a sua voz. Vão-se gastando e perdendo as palavras do seu nome. Os homens não se compadecem com isso e, por acto, confirmam o abandono da carne que se empresta à casa nossa de todos os dia. Por esse abandono, o lugar morre, sem amadurecer. As paredes falem. Há quem diga que é assim porque tem que ser, é o lugar a crescer, a cidade a sair das entranhas da vila, vila nova, como da crisálida, da ruína da ninfa, nasce a mariposa. Mas os homens mentem. Por isso tentam esconder o cadáver do lugar, embrulhando-o em futuro. Inventam cerimónias e orgulhos, exibem o seu estandarte, desfraldam-no ao vento, cantam hossanas, vésperas e esperanças, empinam o peito e olham o céu, pisam o seu chão, mas não vêem o que está diante de si, as insígnias do lugar a sangrar. A memória, pacho fraco, não estanca tal derrame. Fortuna é, sobre aqueles murmúrios já ditos, sentir-se ainda a sombra de um par de asas, majestosas. Sabe-se que não é um anjo que guarda este lugar, é uma águia. Águia que, sempre, abre as suas asas contra a queda, contra a traição, para, pelo seu bater, acordar as paredes que os homens já crêem e querem sem vida. Aos homens, aos senhores deste lugar, falta-lhes aprender a escrever a saudade nas coisas e guardá-las. É que, como a águia nos ensina pela sua vigilância, quando se voa, não se ressuscita das cinzas ou do nome que se deixou apagar. É assim no céu, é assim também no chão, neste lugar.
fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Faria

2006-03-21

LEGENDAFOTO - 6


1ª carta do Além

Caro amigo,
Depois de me ter dado como morto, iniciei a minha viagem para o Além, que eu não sabia muito bem onde era.
Foi difícil encontrar o caminho. Encontrei outros que levavam o mesmo destino e que andavam despistados. Não havia sinalizações. Nem auto-estradas. Tivemos de fazer todo o caminho a pé.
Atravessámos fronteiras. Para as passar não era necessário BI. Bastava a certidão de óbito. Isso é que era indispensável apresentar - a certidão de óbito - não fosse algum mal morrido atravessar a fronteira do Além. Só quem atestasse que era bem morto podia andar livremente. Os outros, os que não estavam bem mortos, tinham de voltar para trás.
Havia quem me dizia que dantes é que era difícil ir para o Além. Tinham de se apresentar declarações 27.003 e outras coisas mais, como requerimentos, pedidos, atestados da Junta de Freguesia e da Câmara, e uma cunha ajudava. Praticamente ninguém ligava ao documento principal. A certidão de óbito. Outros tempos…
Hoje, abriram-se as fronteiras. Tudo é mais prático. Há postos de informação. Inter-comunicadores. Até as almas se ajudam umas às outras. Não há egoísmos. Somos todos iguais.
Mas o Além é difícil de encontrar. Porque ninguém sabe onde fica. Uns dizem que é para a direita, outros dizem que é para a esquerda. Há aqueles que seguem pelo centro sempre a direito. Não olham nem para um lado nem para o outro.
Estimo a tua saúde
Guilherme António



(foto de Pedro Gonçalves)

2006-03-20

FOTOLEGENDA - 11

(foto de Pedro Gonçalves)

Os caminheiros fazem-se ao caminho. Fazem o caminho e fazem-se caminhando. Primeiro de gatas, depois cai ali levanta acolá, até ao passo seguro e sempre a direito. Embora nem sempre o seja, nem seguro nem a direito, e mau prenúncio é se o caminheiro não atenta nos obstáculos, nas rasteiras, se não tem dúvidas sobre qual o caminho e como o fazer.
Também sempre, seguindo as setas que caminhos feitos apontam e aquelas que dentro de cada um nascem e só suas são, procuram os caminheiros companhia, tecto, lume, calor e abrigo, as casas.
Há os que apenas em casas de além ponham a esperança de encontrar o que em todo o lado está, e só olhando em volta, com os outros, com os outros se irmanando, será caminho e viver próprio de ser humano.
Mas, decerto, pelos de Casas de Além bem recebidos serão os caminheiros que por lá passarem e pararem.

(legenda de Sérgio Ribeiro)

foto&legenda # 14


“Mais vale ser um cão raivoso
do que um carneiro
a dizer que sim ao pastor
o dia inteiro
e a dar-lhe de lã e da carne e da vida
e do traseiro
mais vale ser diferente do carneiro
um cão raivoso que sabe onde ferra
olhos atentos e patas na terra.

Viva o cão raivoso
tem o pelo eriçado
seu dente é guloso
e o seu faro ajustado.
Cão raivoso, cão raivoso, cuidado.

Mais vale ser um cão raivoso
que um caranguejo
que avança e recua e depois
solta um bocejo
e que quando fala só se houve a garganta
no gargarejo
mais vale não ser como o caranguejo
um cão raivoso que sabe onde ferra
olhos atentos e patas na terra.

Viva o cão raivoso
tem o pelo eriçado
seu dente é guloso
e o seu faro ajustado.
Cão raivoso, cão raivoso, cuidado.

Mais vale ser um cão raivoso
que uma sardinha
metida, entalada na lata
educadinha
pronta a ser comida, engolida, digerida
e cagadinha.
Mais vale ser diferente da sardinha
um cão raivoso que sabe onde ferra
ferra fascistas e chama-lhe um figo
olhos atentos e patas na terra.

Viva o cão raivoso
tem o pelo eriçado
seu dente é guloso
e o seu faro ajustado.
Cão raivoso, cão raivoso, cuidado.

Mais vale ser um cão raivoso
dentes à mostra
estar sempre pronto a morder
e a dar resposta
a toda e qualquer podridão escondida
dentro da crosta
dentro da crosta das belas ideias
gato escondido de rabo de fora
dentro da crosta das belas ideias
gato escondido de rabo de fora”.
fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Godinho

2006-03-19

FOTOLEGENDA - 10


A hesitação/dúvidas de quem fotografou, a indefinição da foto ajudam a ilusão de que os carris se irão tocar, são a falácia de que as linhas/vidas paralelas no infinito se encontrarão.


(legenda de Sérgio Ribeiro)
(foto de Pedro Gonçalves)

FOTOLEGENDA - 9

(foto de Pedro Gonçalves)

Ai vai foto… venham palavras, disse ele.
Mas quais?
Barco?, pescadores?, mar?, molhe?, farol?
Gaivotas?, talvez...

O barco, pequeno, modesto, é também o barulho, trec-trec, e são também os cheiros que a foto não mostra mas as palavras podem sugerir.
E há pescadores a bordo, saindo para a faina. Não se vêem, mas estão lá. Senão o barco não andava, não havia aquela espuma branca que diz que ele vai a caminho, cortando as águas. Preparadas as redes, comida a refeição mata-bicho, beijada a mulher e os filhos, lá vão eles, os pescadores, esperando boa pesca. E elas ficam, esperando o regresso.
O mar parece calmo, chão, como dizem em palavras suas.
Aliás, nas fotos está o mar sempre parado, como se apanhado distraído ou querendo enganar-nos (como são belos os pores de sol por detrás do mar calmo, parado e, no espaço entre quem tira a foto e o horizonte quem sabe quantos naufrágios haverá?). Porque mar é – sempre – surpresa e engano. Dá-lhe cada coisa às vezes… Oxalá que desta não. A velinha ficou acesa.
O molhe são pedras, arrumadinhas, compactas. É trabalho, é o humano a moldar a natureza de que faz parte. Para cortar ímpetos, para amainar raivas e evitar repetições do que faz a história de tanta povoação ribeirinha.
O farol lá está. No lugar onde o puseram e para cumprir a missão que lhe deram. Quase mítico, com a sua torre, a sua luz que roda, avisa e encaminha, Quase humano. Estou aqui, não vão por aí! E quantas histórias de faróis, feitas de fotos e de palavras!?
Mais palavras? Talvez… gaivotas. Em voo debandado, a ver a partida. Não há nada que lhes cheire. Talvez no regresso… E então o voo será baixo e em volta, como guarda de honra e passadeira vermelha. Bom trabalho!, trouxeram-nos que comer.

A ver vamos. Haverá mais foto? Do regresso da faina?

(palavras de Sérgio Ribeiro)

2006-03-18

foto&legenda # 11


A liberdade é o outro lado, disse Donatien. Mas, reagiu Leopold, às vezes é sobre o limite da liberdade, no limiar que separa e encontra este e o outro lado, que é bordada a vida. Donatien pensou durante um instante sobre o significado de tais palavras. Embora não concordasse com o seu interlocutor, procurou um ponto de intercessão com ele. Concorda comigo, então, num pormenor: a paisagem da liberdade é composta por dois lados, desafiou Donatien. Leopold, sim, concordo, anuiu. Mas, acrescentou de imediato, no entanto, a paisagem da liberdade não é composta apenas por esses dois lados. Para além dos lados, um e outro, há necessariamente o que os faz, há a linha que os aparta. E essa linha é ainda território possível de vida, de liberdade. Donatien tinha dificuldade em acompanhar o raciocínio do companheiro. Sabia pela sua prática que o fulgor dos livres lhe chegava quando se atrevia a ir para além do que estava estabelecido. A condição de solto sentia-a quando se livrava das convenções e calcorreava domínios que, aplacados pelos medos ou pelos modos, outros não ousavam pisar. Por isso, não consigo compreender o alcance da sua lucubração, insistiu Donatien. Para mim, a liberdade é depois dessa linha, porque antes é o cativeiro. O que significa que essa linha é como uma porta. Vista de cá é a saída para a liberdade, vista de lá é a entrada para o cativeiro. Daí que essa linha não seja, por não poder ser, chão de liberdade, mas seja uma zona de transição ou, se preferir, uma twilight zone. Fez-se um longo silêncio de desacordo entre ambos. Continuaram a andar, marcando Leopold a direcção, o sentido e o ritmo dos passos. Ao aproximarem-se do limite do campo, Donatien começou a sentir o apelo do outro lado. O sopro selvagem que residia nele havia despertado. Leopold logrou sustê-lo ali, embora caldeasse em Donatien uma vontade indómita de liberdade. Leopold disse, olhe, vê?, apontando para um pormenor da cerca que estava diante deles. Donatien confirmou, vejo. Ambos, detidos, olhavam um segmento do arame tenso que marcava o interior e o exterior daquele campo. Vê?, continuou Leopold, o mesmo detalhe que nos pode rasgar a carne, a farpa, é também o apoio para outros fios. Como a aranha fez, é possível trabalhar o limite - que é diferente de trabalhar sobre o limite -, utilizando-o para estender a liberdade. Na prática, ao trabalhar-se o limite, o que para alguns parecerá apenas submissão, é possível almofadar e, assim, anular o que é aguilhão e motivo de dor para o nosso corpo. Leopold tornou a apontar para o pormenor que observavam, como que a antecipar a confirmação das suas palavras, trabalhar o limite, no limite, torna possível tecer e suportar um edifício, uma vida. Donatien discordou, isso seria possível se fôssemos pequenos como um insecto, mas, como não somos, não é possível. Leopold tentou encontrar-se com o argumento do outro, falta-nos crescer, não é?, para conseguirmos ser mais pequenos, de um tamanho livre. Donatien não respondeu. Entretanto intensificara-se-lhe mais ainda o instinto e, súbito, saltou para o outro lado. Correu. Naquele momento Leopold ficou atónito. Depois, já recuperado da admiração, assentou de modo firme as mãos sobre o arame farpado, apertou-as para ali sentir-se seguro, e ficou a testemunhar a fuga de Donatien. Enquanto ele se afastava, Leopold começou a sentir as suas mãos a aquecer. O sangue escorria. Um vulto desvanecia-se no horizonte.
fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Faria

2006-03-16

legenda&foto # 7

Money makes the world go (a)round.

Ao longo dos anos muitas foram as vezes em que o Américo lhe rogou um cigarrito. Apesar da insistência, nunca teve sorte o Américo. Até que um dia alterou a moda, deixando de pedir um cigarrito para passar a pedir uma moedita. A sorte do Américo mudou. Agora, com frequência, o Américo acerca-se dele e sabe certo que, embora ele não fume, habitualmente transporta moedas no bolso. A última vez que o Américo lhe perguntou tens aí uma moedita?, hoje, ele deu-lhe duas moedas, uma de dois euros, outra de dez cêntimos. Com a moeda de dois euros o Américo comprou um bilhete de lotaria instantânea. Com a moeda de dez cêntimos raspou onde era para raspar. Percebendo que ganhara cinquenta euros, o Américo inverteu o ritual. Dispensou o sussurro de rogo, a proximidade também, e, em alta voz, à distância, perguntou, queres tomar alguma coisita?, hoje pago eu.

legenda © Segismundo
fotografia © Nuno Abreu

2006-03-15

FOTOLEGENDA - 8

(foto de Pedro Gonçalves)

Esta será a versão moderna – financeira, fiduciária –, de uma parábola que um grupo de alunos da cadeira de “integração económica”, no começo dos idos anos 80 do século passado, colocaram num trabalho que entregaram ao professor da cadeira.
Nesses idos tempos, em que os telemóveis não falavam, as moedas não eram únicas e os bancos (ainda) não tinham os lucros que hoje têm, até porque – pasme-se… – estavam nacionalizados, o local onde se passava a curtíssima história era a porta de uma barbearia.

Era uma vez um cego que, à ilharga de uma barbearia, tocava gaita-de-beiços, em jeito de contrapartida para as esmolas que pretendia receber em troca. Sim, porque pedir esmola sem nada oferecer em paga nunca foi coisa que mendigos com dignidade fizessem.
O barbeiro todo o dia ouvia a mesma música mal tocada até que cansado ficou, talvez porque, como acontece a tantos barbeiros, nem sempre há muito que fazer e as horas sem clientes para cortar cabelos ou rapar barbas são difíceis de passar. E mais se passou … por ter de ouvir aquele cego e a sua gaita-de-beiços todo esse tempo.
Então, o barbeiro, cruel como alguns são em qualquer profissão, foi, pé-ante-pé, e num momento (raro, raro!) de pausa do pobre cego, trocou-lhe a gaita por uma das suas navalhas.
O cego não deu pela troca, e recomeçou a sua função.
Só que não saia som nenhum daquele instrumento a que, para bem se contar, se deveria chamar navalha-de-beiços.
O que é inexplicável é que o sorriso do cego se ia tornando cada vez mais rasgado…
____________________________________________
PS: a propósito:
por onde andarão esses então finalistas do curso de economia, mais cruéis que barbeiros cruéis? Passado quase um quarto de século a suma ironia seria que algum deles fosse, hoje, administrador do Barclay’s, ou um quadro de topo, responsável pela campanha “procure a sua estrela”

(texto de Sérgio Ribeiro)

FOTO&LEGENDA - Elvira

Traquinices exibicionistasFonte Grande, Formigais
No início da Primavera do ano passado, ia eu a passar de bicicleta por este local encantador.
Estava um grupo de putos, com idades incluídas entre os 7 e os 12 anos, a tomar banho no rio.
Começaram a chamar por mim ("Ó boazona!") *.
Olhei para lá...
Estavam todos de cuecas baixadas, mostrando-me orgulhosamente as pilinhas e rindo às gargalhadas.
Disse-lhes que não estava nada espantada, claro, e que aquele material era demasiado pequeno para interessar qualquer mulher que fosse... Ainda riram mais!
Bem... se já são assim com pouca idade, não é de admirar que se tornem os adultos que conhecemos. Putos traquinas da minha terra!
________________________________________
* Não imaginem coisas! Para garotos daquela idade, qualquer pessoa de sexo feminino, pesando menos de 80 quilos e mais nova que a avó, é uma boazona, sobretudo vista ao longe...!
___________________________________________________

PS: mas devo confessar que me ri bastante quando cheguei à casa...! ;-)
(
(de Janelvira, com a devida vénia... e sem direitos de autora)

2006-03-14

foto&legenda # 9


Sinto-me uma natureza morta, um corpo ex machina. Sinto a alma quase sucata. Sinto-me sem força. Mas, a cortar o firmamento, as minhas asas já foram mais vigorosas do que todas as asas de todos os arcanjos. Agora, condenado pelo prazo, quieto, sou um mero espectador do céu. Vejo-o de baixo. É uma vista triste, que apenas me permite a fome e faz em mim, caída, a sensação da morte lenta. A erosão da minha carne pelo tempo impede-me o resgate para agora. Pousado não tenho regresso. Sei até que Ícaro deixou de ter inveja de mim e que, como um abutre, já começou a cantar I can fly, but I want his wings. Mas, mesmo no chão, não me rendo. Não sou um sonho, sou uma máquina voadora. Voo África.
fotografia © José Silva Pinto
legenda © Sérgio Faria

foto&legenda # 8

À superfície todos os corpos são diferentes, com um desenho apenas seu, com uma pele exclusiva, não partilhável ou partilhável somente pelos sentidos, não pela comunhão. É sobre essa incomunidade dos corpos que se funda a singularidade - permita-se o pleonasmo, a singularidade de cada um de nós. Mas sob a superfície dos corpos percebe-se também um universo de invariáveis. Aí residem as mesmas fragilidades, os mesmos demónios, os mesmos sopros do mesmo sangue quente, os mesmos dispositivos animais. Os corpos, portanto, são também a cicatriz sob as suas tatuagens. Pelo que, em si, a variação que conhecem é a que lhes traz o vento. Enquanto corpos, é essa a sua única e derradeira unidade.
fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Faria

2006-03-13

legenda&foto # 6

Sobre aquele outeiro, montada por mãos, como sequência justaposta de blocos de pedra, existe uma fortaleza. É uma fortaleza que foi conquistada, que fez o tempo, mas não o segurou. Daí que, hoje, no seu interior, a céu aberto, esse tempo não se repita. As ruínas que lhe sobram são o manifesto de uma glória antiga, já morta. Mas, aqui, sob a sua sombra, vivemos. É essa sombra que, à noite, ainda tentamos iluminar. Para que a fortaleza não adormeça e, a todas as horas, continue a ser o nosso farol, o corpo vigilante que, como uma estrela, nos coordena a distância e convoca para si.

legenda © Sérgio Faria
fotografia © Nuno Abreu

2006-03-12

FOTO&LEGENDA - 7

(Foto de Pedro Gonçalves)
Que fazer com esta foto? Que legenda lhe dar?
Sabia lá eu, eu que nem sabia nada da barbearia e do homem.
Antes de receber a foto, só tinha espreitado lá para dentro, quando passava, a pé, e atirava um bom dia que nem sei se correspondido era. Quase sempre depois ter de fugir (e com pena…) da conversa com o senhor Manuel Cartuxo.
A única solução era a de lá ir. Cortar o cabelo. Quando estivesse a precisar.
Foi esta semana.

A cadeira estava ocupada e o fotografado em actividade.
“Bom dia!”
“Bom dia! Não demora, é já a seguir... pode esperar?”
Esperei, folheando revistas velhas e ouvindo, de ouvido distraído, a conversa solta. De barbeiro.
Não demorou. Sentei-me na almofada que se vê em primeiro plano, e tentei dar instruções sobre como queria o corte do cabelo e da barba.
Mas o homem estava distraído, olhando para mim atentamente. Em directo ou pelo espelho. Até que “sabe?, o senhor é muito parecido com um alguém que aparece aí nos jornais… um tal Sérgio-qualquer-coisa”. “Ah, sim?!”, respondi e sorri.
Ele começou a função. A tesourar. Sem tempo para o silêncio se instalar porque insistiu “É parecido, é!, e – sabe? – ainda outro dia falámos muito dele, eu e um primo dele, o Manel que foi do senhor Zé Dias…”.
Ainda pensei deixar ir a cena mais adiante, mas achei que seria desleal (e podia ouvir coisas de que não gosto...): “Pois é… sou muito parecido comigo…”
Não apanhou logo a ironia (estas minhas graças a que só eu acho graça…), mas lá chegou: “Ah, sim? É mesmo ele?”, “Sou, sou mesmo eu…”
E começou uma longa conversa. Ou melhor, um longo monólogo entrecortado por apoios e interjeições da minha parte.
Fiquei a saber quase tudo da vida do senhor António Silva. Que mora no Caneiro, que tem muitos anos na “arte e ofício”, 22 em Fátima e 15 aqui em Ourém, que tem filhos, um deles, de 42 anos (se me não engano), estucador, de que me mostrou um calendário ao lado do espelho, que tem netos que uma filha lhe deu. Contou coisas sobre as obras que fez, sobre as cadeiras, o custo das ferramentas. E mais e muito mais.

Deu, até, para “passar pelas brasas” enquanto a tesoura ia cortando. Demais como me vim a aperceber… tarde de mais.
Foi um corte de cabelo “à antiga” (quais lavagens, quais shampôos, essas modernices…), a lembrar-me os de há décadas, na Rua Luciano Cordeiro, no velho amigo José Nunes, do Alqueidão, porque os de Ourém em Lisboa só aí deviam cortar o cabelo, como determinava o senhor meu pai!...

No final da função, o senhor António Silva não me deixou sair sem me abrir um anexo, onde me mostrou o artesanato a que se dedica, por encomenda. O de fazer terços.
Explicou-me a técnica do arame e do alicate. E prometeu-me que, da próxima vez, me vai oferecer um terço.
´Tá bem. Obrigado.
Legenda de Sérgio Ribeiro

LEGENDA&FOTO - 5

O Fabrício

Abri um estúdio de fotografia há pouco tempo. Fica num canto escondido, de frente para umas escadas, no interior do que, quase, se pode chamar um centro comercial em Ourém. É um sítio movimentado. Do outro lado das escadas está um supermercado que vai resistindo às investidas dos grandes grupos que por aqui ainda não cravaram o dente.
Depressa me acostumei à presença do Fabrício. Não consigo dizer a sua idade (mais de 20 e menos de 35). Geralmente tem o cabelo pintado de amarelo que o tempo e falta de água acabam por escurecer. Os olhos são ainda mais estranhos. Não é estrábico, mas um dos olhos está excessiva e teimosamente virado para o lado. Isso confunde as pessoas pois nunca se sabe para onde está a olhar.
O Fabrício não tem hora marcada. Sei sempre quando chega porque nunca pisa os últimos quatro degraus da escada. Gosta de saltar -lhes por cima e aterrar com grande estrondo em frente ao supermercado. Passa os dias sentado nas escadas com uma caixa que já não é de sapatos mas de esmolas, a mendigar o que lhe dão.
A voz chegou lá de fora: "Eu com a tua idade já trabalhava, e muito! Não és aleijadinho nem nada. Vai trabalhar!” – “Eu vou! Você dá-me trabalho? Faço o que quiser, limpo, despejo o lixo, varro, faço recados… eu quero é que me dêem trabalho!"
O outro, que não esperava a estocada, encaixou e calou. Mal sabia que Fabrício, para além de não ser aleijadinho, também era de resposta pronta e afiada. Hoje, sabendo o que sei, tenho a certeza que se lhe pedirem para varrer as escadas de um prédio de vinte andares por dois euros e meio, o Fabrício não hesita.
Noutra ocasião, uma Senhora, daquelas que engana o tempo com pinturas espampanantes, laca no cabelo e pouco ou nada que fazer, ainda experimentou, "… eu sei muito bem que o menino gasta o dinheiro que lhe dão em guloseimas e porcarias que só fazem mal." O Fabrício nem esperou pelo fim da frase e já contra-atacava "… comprei!... mas não foi com o dinheiro que tu me destes...", e ainda atirou "toma que já almoçastes!" O cabelo armado por dois litros de laca estremeceu e a senhora fez-se à vida.

O Fabrício tem duas paixões. A música debitada por dois auscultadores colados aos ouvidos e correr. Correr, correr, correr... O passo lembra os seus olhos. É desconcertado, mas firme. Corre todos os dias antes e depois de pegar ao trabalho de mendigador de escadas. Traz no bolso uma lista dobrada em quatro com as maratonas e todo o género de corridas que se vão realizar no corrente ano. Ano que, por ser feito de dias e horas, também passa a correr, às vezes depressa, outras com o peso de uma corrente enrolada ao pescoço. Mesmo assim, o Fabrício aguenta sereno, sentado, com a determinação de quem espera uma moeda que se adivinha melhor que a última.
Nestes dias de Natal, o tempo parece um sprinter carregado de doping nas veias. Corre que nem uma flecha, e o Fabrício em tom de confidência lá vai dizendo "Nunca vi uma coisa assim! As moedas já nem cabem no bolso!"
Então, fecho a porta, rio e atiro contente "assim é que é Fabrício! Aperta com eles." Subo as escadas, local de trabalho de um dos mendigadores de escadas mais velozes que conheço, e sigo em direcção a casa com pena de não ter a resposta pronta e afiada que tantas vezes me apetecia dar e não dou. "Toma que já almoçastes!"

Pedro

Um dia, pelo Natal, o Sérgio Ribeiro recebeu, por mail,
este texto do Pedro Gonçalves;
agora, devolveu-lho como proposta de legenda para uma foto:
“toma que já almoçaste!”

O Pedro Gonçalves depressa fez a fotografia para a legenda
(“toma que já almoçaste!”)

e aí está mais uma legenda&foto destes dois

2006-03-08

foto&legenda # 6


A essência do dia dispensa legenda, porque cheira a Hamlet, o louco, espectro de homem, em espectro de pai, em espectro de forma. Ou porque na interrogação sobre o ser há uma resistência chamada mulher cabeça. Obviamente, Salomé vence, ganha a cabeça. Aliás, nas tragédias elas vencem sempre. E ainda bem. Conta-se que foi uma mulher que começou tudo, num gesto simples, tentado, insurrecto, livre, ao trincar uma maçã. Antes havia apenas um jardim, o éden. Hoje, abertas as portas, abertos os mapas, há muitos. E há uma mulher, corpo e fruto de todos os pomares, no princípio de tudo, até ao fim.

fotografia © Jan Saudek
legenda © Sérgio Faria

foto&legenda # 5

Há corpos que são apenas metáfora, porque são outros os corpos que lhe emprestam a forma. Daí a urgência de sofrer a sua geometria, de encontrar-lhe a raiz, de sentir-lhe a seiva, o plano, o fulgor. A memória não é suficiente para revelar o que uma forma é. A luz também não. Há, pois, que tocar essa forma quando concreta, cheia, tocá-la no modo que a desperta, ir para além do que é a sua superfície, ir para além do que é o seu volume. Há que tocar essa forma para recordar por onde, depois de guardado o segredo, se saiu. A natureza é mãe por esse toque, por esse encontro. O demais é apenas saída ou volta. E há-de ser húmus.
fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Faria

FOTO&LEGENDA (Dia da Mulher) - 4



Há uns anitos – umas décadas… –, ao traduzir um livro de economia, tropecei na insólita dificuldade de encontrar, em português, uma expressão correspondente a “seulement les fleurs en plastique sont toutes identiques” e encontrei esta: “só as flores artificiais são todas iguais”.
Tenho-a usado, por vezes pondo rosas e cravos em vez de flores.

Lembrei este episódio ao olhar esta foto, e em vez de flores, rosas, cravos, é a palavra mulher e é o nome Maria que me assaltam; é o antónimo boneca-operária e é a escolha entre Cátia e Maria Albertina que me apelam a misturar em combinações que teçam as representações da realidade.

Esta foto não é artificial porque o modelo não é de plástico.
Há verdade no rosto jovem, mas porquê os olhos (que lindos devem ser…) fechados?, porquê os braços parecem fechar(-se sobre) o corpo?

Escolha do fotógrafo?, ou contenção do modelo?
Saberão eles a resposta?

FOTO&LEGENDA (Dia da Mulher) - 3


Não foram os dedos que se tocaram.
Não foi Da Vinci a pintar a criação do Mundo.
Foi muito mais!

Não foi um dedo-deus a tudo criar num gesto divino,
foi a mão-mãe que se deu aos dedos-filhos,
filhos de um seu parto,
frutos de um acto humano,
dedos nascidos de vidas que quiseram fazer vida.

E não foi Leonardo que pintou,
foi o Amigo que fotografou.

Nada disto ficará na História do Homem
– nem a Mãe, nem o Filho, nem (talvez…) o Amigo –
mas esta é a história dos homens e das mulheres!

(para 8 de Março de 2006)

foto de Pedro Gonçalves,
legenda de Sérgio Ribeiro

LEGENDA&FOTO (Dia da Mulher) -1

Aos meus filhos

No dia em que partir de mim a vida
Gostava de ficar

Não somente na carne e sangue que te dei
Na cor do teu cabelo
Nesse jeito, tão meu, que tens de olhar
No seres meu filho e eu ser tua mãe

Gostava de ficar
Muito pr’além dos traços teus em que me reconheças
Recordações, imagens e vivências
Poemas sufocados em folhas de papel
No meio do teu nome, um nome igual ao meu

Gostava de ficar
Liberta enfim da luta de ter sido
O que sido tiver na vida que deixei

Ficar no teu amor, meu filho,
Não por mim

No teu amor à vida que te dei.
poema de Eugénia Cunhal
(proposto por Sérgio Ribeiro)

foto de Pedro Gonçalves

2006-03-07

FOTO&LEGENDA (Dia da Mulher) - 1



Então, estes dois
resolveram à sua maneira
(e deste blog)
assinalar o 8 de Março,
o dia da Mulher



Vai daí, o magriço e altarrão
mandou para o mais ancião e nada roliço
esta foto

Logo o outro disse "'tá bem, sim senhor!" e acrescentou, como gosta de acrescentar, "é p'ra já!"

E aí está a legenda:

Enquanto
a mulher

Os olhos fechados deixam adivinhar ternura.
Os lábios desenhados, linhas suaves, sombra e luz.
Os braços cruzados sobre o corpo como carícia leve.

A mulher.
Só mulher.
Enquanto.
Esperando.
Vivendo ser mulher.

O fotógrafo foi, apenas, o que agarrou o momento,
o que conseguiu fixar o enquanto.
A ternura adivinhada,
as linhas suaves,
a sombra e a luz,
a carícia suave.
Tudo o que a máquina foi guardando.
O encanto.
Aquela mulher:
a mulher!

legenda&foto # 4

Boulevard nocturna. Sabe-se pouco sobre o caso. Sabe-se que, sem hora, sem sombra, sem exactidão, sem ritmo, saía de casa para caminhar demoradamente ao longo da avenida, sobre o extenso traço branco intermitente. Sabe-se que pisava aquele chão para confirmar-se ali, para fazer sobre ele o seu apoio e o seu movimento. Eram por hábito, quase ritual, os passos. Passos que eram também um exercício de reencontro e de abrigo, prova de vida. Muitas madrugadas, mais de mil, caminhou, indo e devolvendo-se por aquele caminho, carne da sua cidade. Até que uma noite, após tanto caminhar aquele caminho, aconteceu que a avenida tornou-se intensão do seu corpo e o seu corpo tornou-se extensão da avenida. O que era hábito transformou-se em culpa, rota de sangue, ser dali.

legenda © Sérgio Faria
fotografia © Nuno Abreu

2006-03-03

LEGENDA&FOTO - 3

Retirado de "o castelo":

Artigo: Foto & Legenda por Adsum em março 2, 2006 09:51 PM:
Muito felicito os "idiotas" deste novo blog pela ideia da criação deste novo espaço tão digno da blogosfera e da promoção da arte da fotografia e da boa escrita! Mas o que me traz aqui hoje é um motivo menos positivo.... que a meu ver se enquadra neste espaço...

Esta manhã, “Ourém, com vista para o Castelo”, estava triste! Não só porque o céu cinzento não realçava o brilho do Castelo no seu mais alto esplendor, mas também e principalmente, por que diversas foram as pessoas que sentiram nesta manhã, igual a tantas outras, o peso da insegurança numa terra que sempre julgou ser segura - a sua!!
Às 8 da manhã, junto à esquadra da polícia, mais do que os dedos de uma mão pudessem contar, estava um rol de pessoas, excepcionalmente despertas e despertadas, que tinham sido vítimas de assaltos e arrombamento às suas viaturas! Em plena cidade de Ourém! Eu contei 8 queixosos e vi pelo menos mais uma viatura arrombada que não se queixou!
(…)
Diga-se que não é um rádio qualquer!!!! Lia mp3 (coisa que, com o devido respeito à autoridade, passou por marca de rádio), com entrada de cartão e USB e tinha comando! Sylver Crest! Se desconfiarem de alguém avisem-me por favor! É que os pobres moços ou moças assaltantes esqueceram-se de levar a caixa e a garantia do rádio que estavam ao lado! Mas pronto, até fico descansada porque não se esqueceram do comando!Após ter resolvido toda a papelada na polícia (3 horas depois) e de o carro ter sido sujeito a uma triagem das impressões digitais, dirigi-me a pé à feira semanal, não fosse o diabo tecê-las e o rádio estivesse por lá. Sim! Ao que parece os assaltos, vá-se lá saber porquê costumam ocorrer de quarta para quinta-feira! Mas não estava!Por isso já sabe, senhor ourieense, de quarta para quinta se não quiser ser assaltado não se perca com a vista dos Castelos! Olhe antes para a sua viatura, retire todos os valores, compre um sistema de alarme, ou durma lá dentro se possível! Eu, como não tenho garagem, dinheiro ou paciência, pelo sim pelo não, já arranjei um rafeiro com dentes aguçados para me guardar a viatura de quartas para quintas! Balanço? Nem quero pensar nisso! Uma porta nova, um rádio novo, uns óculos novos… mas sem dúvida que o maior prejuízo que tive foi o sentir-me insegura mesmo à porta da minha casa! Aqui na nossa cidade, em Ourém! Como é que tudo isto é possível?
(escolhido para "legenda" por Sérgio Ribeiro,
que teve o arrojo de encurtar o texto e de lhe fazer uma ligeiríssima modificação)

(foto de Pedro Gonçalves, depois de ter lida a "legenda" sugerida)