2012-09-25

foto&legenda # hors-série (a linha das máquinas macias)

Light reflects from your shadow
It is more than I thought could exist
You move through the room
Like breathing was easy
If someone believed me
*

Compreende-se mesmo quando não se compreende. É uma questão de reciprocidade, de ver através do que é, como é. Ela é bonita, tenra, ele está fardado e armado, parece duro, é remunerado para ser duro. Mas aqui o que importa não é ela, também não é ele, é a situação. E a situação é a seguinte. Conheço o rapaz que está de calções, corpo equilibrado no foco, com a máquina olho apontada para capturar a alma posta dentro do amplexo, o amor que tenta interromper o alvoroço, sem deixar de ser alinhamento do corpo, dos corpos, com o manifesto. Os ícones são feitos sempre desse alinhamento invisível, de alguém que esteve próximo, quase como se não tivesse estado, e que, em diferido, nos permite estar no momento e no caso em que não estivémos.
fotografia © Nuno Botelho
legenda © Sérgio Faria
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* Versos da canção “Angels”, do álbum Coexist (Young Turks, 2012), da banda The xx.

2012-09-20

foto&legenda # 496 (contar)

Esta reunião faz-nos contar outra vez. Quantos somos?, estamos entretidos neste diálogo de perguntas dentro de perguntas (mais de sentido do que de forma) que nunca acabam. Começam as dúvidas. Contando o cão, contando o polícia, contando a criança às cavalitas, contando os outros, somos muitos. É isto, este pronome indefinido, resposta que chegue? Contando contigo, que trazes e mostras as palavras em que acreditas, somos ainda mais, somos exactamente quantos somos, portanto mais do que muitos. Sei que posso contar contigo e que, se te perguntasse porquê?, tu explicarias melhor do que sou capaz de fazer agora.

fotografia © Paulo Vaz Henriques
legenda © Sérgio Faria

2012-09-18

foto&legenda # 495 (os dias do intervalo)

A cidade é um lugar grande. Em inteiro ou em parte, somos nela os dias todos, condenação de que não há remissão, liberdade de que não há soltura. Alguém pode afastar-se, ir ou voltar à serra, porém a cidade vai também, se é que não está já lá. É um caso de compreensão indiferente à vontade de quem compreende. A cidade está onde estamos, está connosco, compreende-nos do mesmo modo que a compreendemos. Mais do que um sentimento - que é -, é uma condição. Estamos a aprender a viver com ela, a conhecermo-nos melhor, no combate contra os espectros e a realidade que os espectros revelam. Precisamos de conversar, precisamos de estar. A estação não está para piqueniques. E não é só porque o futuro já não é o que era. Nunca foi. Facto que estamos a começar a saber com mais certeza para não repetir o engano de confiar sem acertar as contas, de modo a que, no fim e depois, as contas batam certo ou pelo menos o erro seja detectado quanto antes e o menor possível. Precisamos de estar para isso, aritmética e política. Citando um clássico, o desgoverno não é órgão de soberania.

fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Faria

2012-09-12

foto&legenda # 493 (cartas abertas ao primeiro ministro)

Não julgue que não sabemos, sabemos. Sabemos também bem o que dizemos.

fotografia © Paulo Vaz Henriques
legenda © Sérgio Faria

2012-09-04

foto&legenda # 492 (maybe it was an iguana)

Se se fala de bicicletas, fala-se de voar - o nome e o verbo estão associados -, pelo menos na realidade. Na ficção - a gramática permite tanto quanto a matemática - talvez seja diferente. Se calhar não existem extra-terrestres, se calhar não há uma ponte lá em cima, se calhar o mundo não foi pensado para se usarem os pés para subir e descer, vice-versa e pedalar. É possível que existam mais orações do que imagens sobre isto. O que é que interessa?

fotografia © Nuno Abreu
legenda © Sérgio Faria