2006-03-12

FOTO&LEGENDA - 7

(Foto de Pedro Gonçalves)
Que fazer com esta foto? Que legenda lhe dar?
Sabia lá eu, eu que nem sabia nada da barbearia e do homem.
Antes de receber a foto, só tinha espreitado lá para dentro, quando passava, a pé, e atirava um bom dia que nem sei se correspondido era. Quase sempre depois ter de fugir (e com pena…) da conversa com o senhor Manuel Cartuxo.
A única solução era a de lá ir. Cortar o cabelo. Quando estivesse a precisar.
Foi esta semana.

A cadeira estava ocupada e o fotografado em actividade.
“Bom dia!”
“Bom dia! Não demora, é já a seguir... pode esperar?”
Esperei, folheando revistas velhas e ouvindo, de ouvido distraído, a conversa solta. De barbeiro.
Não demorou. Sentei-me na almofada que se vê em primeiro plano, e tentei dar instruções sobre como queria o corte do cabelo e da barba.
Mas o homem estava distraído, olhando para mim atentamente. Em directo ou pelo espelho. Até que “sabe?, o senhor é muito parecido com um alguém que aparece aí nos jornais… um tal Sérgio-qualquer-coisa”. “Ah, sim?!”, respondi e sorri.
Ele começou a função. A tesourar. Sem tempo para o silêncio se instalar porque insistiu “É parecido, é!, e – sabe? – ainda outro dia falámos muito dele, eu e um primo dele, o Manel que foi do senhor Zé Dias…”.
Ainda pensei deixar ir a cena mais adiante, mas achei que seria desleal (e podia ouvir coisas de que não gosto...): “Pois é… sou muito parecido comigo…”
Não apanhou logo a ironia (estas minhas graças a que só eu acho graça…), mas lá chegou: “Ah, sim? É mesmo ele?”, “Sou, sou mesmo eu…”
E começou uma longa conversa. Ou melhor, um longo monólogo entrecortado por apoios e interjeições da minha parte.
Fiquei a saber quase tudo da vida do senhor António Silva. Que mora no Caneiro, que tem muitos anos na “arte e ofício”, 22 em Fátima e 15 aqui em Ourém, que tem filhos, um deles, de 42 anos (se me não engano), estucador, de que me mostrou um calendário ao lado do espelho, que tem netos que uma filha lhe deu. Contou coisas sobre as obras que fez, sobre as cadeiras, o custo das ferramentas. E mais e muito mais.

Deu, até, para “passar pelas brasas” enquanto a tesoura ia cortando. Demais como me vim a aperceber… tarde de mais.
Foi um corte de cabelo “à antiga” (quais lavagens, quais shampôos, essas modernices…), a lembrar-me os de há décadas, na Rua Luciano Cordeiro, no velho amigo José Nunes, do Alqueidão, porque os de Ourém em Lisboa só aí deviam cortar o cabelo, como determinava o senhor meu pai!...

No final da função, o senhor António Silva não me deixou sair sem me abrir um anexo, onde me mostrou o artesanato a que se dedica, por encomenda. O de fazer terços.
Explicou-me a técnica do arame e do alicate. E prometeu-me que, da próxima vez, me vai oferecer um terço.
´Tá bem. Obrigado.
Legenda de Sérgio Ribeiro

4 comentários:

Anónimo disse...

Engraçado... Isto é para ficares a saber o quanto vale a pena escrever e continuar a escrever para o jornal. Há pessoas que não deixar passar despercebido a coluna de 'um tal muito parecido com um Sérgio-qualquer-coisa', do nosso Sérgio Ribeiro!!!
Um abraço,

Sérgio Ribeiro disse...

Obrigado pela ajuda, Nuno.
E parabéns por mais um golo, que não tive a oportunidade de te dar ontem.
Cada vez que te vejo a jogar - e a marcar golos - sinto uma grande alegria. É o futuro a dizer que existe. E há quem ande esquecido disso...
Um grande abraço

Anónimo disse...

Mais uma crónica, com pormenores na descrição muito engraçados.
Apesar de nunca ter entrado numa barbearia, não nutro de grande simpatia quando as vejo. Somente por causa das cadeiras, fazem-me lembrar a dos dentistas!!!
Não sabia que se podia cortar o cabelo sem se lavar, pelo menos molhar!
Eu começava logo por perguntar, onde estava o esterilizador de pentes e das tesouras.
Ele sabia que te conhecia de qualquer lado!!! Ficamos a saber que o simpático Sr. Silva, nunca votou em ti!!!
Para a próxima já sabes enquanto cortas o cabelo, podes ir rezando um terço!
Depois dizem que as mulheres falam muito!
Mesmo sendo um “longo monólogo” o Sr. António Silva foi bastante simpático.
Falou da família, dos amigos, do que (possivelmente) mais gosta de fazer, artesanato!
Gostava de te ver sair da barbearia com o terço nas mãos!
O Pedro G. tem de registar o momento!

Gostei da fotografia.

(espero que não venham cá jogar no dia 25/03!!!VI Assembleia)

GR

Anónimo disse...

Sou novo por aqui.

Gostei bastante da crónica até porque conheço a barbearia. E o senhor barbeiro em causa foi o responsável por uma série de carecadas que me faziam corar de vergonha na escla no dia seguinte, eh eh!