2008-05-03

foto&legenda # 412 (unitive knowledge of the godhead)

É uma história de rapazes, como nos filmes em que há muita gasolina derramada e os carros explodem. Começou com uma confissão, tinham sonhos, tinham sombras, casacos de ganga para enganar a condição. Não queriam ser mecânicos ou carteiros, por não gostarem de entregar cartas de amor. Por isso ou por qualquer outro motivo, deus atribuiu-lhes uma ordem de restrição. Não poderiam aproximar-se do desvio, sequer pelo lado da dúvida ou da tentativa. Deveriam portar-se bem, com esforço e esmero, e crescerem, até serem homenzinhos. O fado, a fé e o futebol ajuda-los-iam. Mas cresceram fora do trilho, a ouvir música estrangeira e maluca, a jogar à batota e a baixar as cartas sobre mesas com cinzeiros cheios de beatas, sentados com o comando da playstation em cima dos joelhos e os polegares a conduzirem o manípulo, com a garrafa de cerveja mole entornada ao lado, no sofá, no chão. Pensaram em coisas proibidas, aventuras, pornografia, sondagens, excessos e emigração. Agora fazem downloads piratas e fumam em pose de gangster. Durante a semana usam gravata, combinada com as camisas passajadas impecavelmente pela mãe e os fatos. Dominam os logos, as siglas e o teclado do telemóvel. Deus perdeu-lhes o domínio e os onze por cento da taxa social única. Já não mandam o curriculum vitæ à amostra, têm a fotografia no hi5. São o princípio e a continuação reencarnada de Οδυσσέας.
fotografia © Paulo Vaz Henriques
legenda © Sérgio Faria

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